quarta-feira, 29 de setembro de 2010

As duas faces do Ministério do Meio Ambiente




A matéria acima, publicada em 04 de setembro de 2009, três meses após o julgamento da ADPF 101 pelo Supremo Tribunal Federal que decidiu pela constitucionalidade da proibição de importação de pneus usados imposta pelo Executivo Federal, se refere à mudança de postura do Ministério do Meio Ambiente em relação à obrigação ambiental dos fabricantes e importadores de pneus novos (Goodyear, Pirelli, Bridgestone, Michelin e Continental), obrigação que também estavam sujeitos os importadores de pneus usados para fins de reforma, de dar destinação final aos pneus impróprios para o uso ou reforma (pneus inservíveis), na proporção de suas participações no mercado.  

Para "convencer" os Ministros do Supremo Tribunal Federal a proibir a importação da matéria-prima da indústria de reforma (os pneus usados), o Ministério do Meio Ambiente sustentou que havia um passivo de 100 milhões de pneus velhos no território brasileiro, muitos destes em condições de reforma sendo, portanto, desnecessária a importação. Na prática, depois da decisão do STF, várias empresas fecharam por falta de pneus usados em condições técnicas de reforma. 

Em sentido contrário, para atender pedido dos fabricantes e importadores de pneus novos, de reduzir as metas de coleta e destinação final de pneus inservíveis, o mesmo Ministério, na 92ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, datada de 26 e 27 de novembro de 2008 (sete meses antes do julgamento da ADPF 101), conforme ata disponibilizada no site
afirmou que não há nem nunca houve o tal passivo de 100 milhões de pneus velhos. Disse mais, que "Nós precisamos ter cuidado na hora em que usamos o conceito de passivo ambiental, porque passivo ambiental normalmente é um termo utilizado – e isso nós vamos ver na Resolução de áreas contaminadas, na Proposta de Resolução - para normalmente por um acidente; hoje ele é utilizado para isso. Um acidente derrama óleo e isso vai gerar um passivo a ser destinado. O que é esse passivo? É resto de produtos com resíduos, misturado com o solo. Quando falamos de pneu, aquilo que é pneu novo e se torna pneu usado e inservível, não pode ser considerado um passivo a ser destinado".

Ora, perante o STF o órgão ambiental afirmou que os pneus usados importados eram passivo ambiental de outros países a despeito do importador, antes do embarque no exterior, eliminar idêntica quantidade de pneus inservíveis no território nacional. Perante o CONAMA, para defender interesses as multinacionais dos pneus novos o órgão submeteu o interesse público (defesa do meio ambiente), à vontade do interesse privado.

O que mudou com a nova Resolução aprovada pelo CONAMA a pedido do Ministério do Meio Ambiente e dos fabricanmtes e importadores de pneus novos?

1)    A meta que antes era de 5 pneus inservíveis para cada 4 pneus novos colocados no mercado mudou para 1 pneu inservível para cada 1 pneu novo.

2) A obrigação ambiental que antes abrangia todos os pneus novos (fabricados ou importados), passou a abranger apenas os pneus novos destinados ao mercado de reposição. 

O mercado interno é dividido em reposição (40%), montadoras (26%), exportação (34%). Com o presente do Ministério do Meio Ambiente aos fabricantes, que a matéria acima da Folha de S.Paulo afirma terem deixado de dar destino final a 20 milhões de pneus inservíveis por ano (entre 2002 e 2007), a obrigação caiu de 125 para 40%.

Como era a Resolução CONAMA nº 258/99?

Art.1o As empresas fabricantes e as importadoras de pneumáticos ficam obrigadas a coletar e dar destinação final, ambientalmente adequada, aos pneus inservíveis existentes no território nacional, na proporção definida nesta Resolução relativamente às quantidades fabricadas e/ou importadas.

Art. 3o Os prazos e quantidades para coleta e destinação final, de forma ambientalmente adequada, dos pneumáticos inservíveis de que trata esta Resolução, são os seguintes:

IV - a partir de 1o de janeiro de 2005: 

a) para cada quatro pneus novos fabricados no País ou pneus novos importados, inclusive aqueles que acompanham os veículos importados, as empresas fabricantes e as importadoras deverão dar destinação final a cinco pneus inservíveis;
Como ficou a Resolução CONAMA nº 416/09?

Art. 3
o A partir da entrada em vigor desta resolução, para cada pneu novo comercializado para o mercado de reposição, as empresas fabricantes ou importadoras deverão dar destinação adequada a um pneu inservível.

Portanto, ficaram de fora os pneus comercializados com as montadoras. 






Impasse jurídico internacional mantém pneus usados no porto do Rio

Jornal O Estado de São Paulo

27 de abril de 2010

Dez meses após STF proibir importação de pneus, mais de 150 contêineres do material, vindos da Europa e do Japão, ainda aguardam uma destinação final

 
RIO - Dez meses depois da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proibiu definitivamente a importação de pneus usados no Brasil, mais de 150 contêineres do material, vindos da Europa e do Japão, ainda aguardam uma destinação final no porto do Rio, envolvidos em um impasse jurídico que impede, inclusive, o retorno dos produtos aos países de origem.
A empresa Bética, que fazia a recuperação de pneus usados e trouxe 100 desses contêineres para o País, pede a liberação do material com o argumento de que a carga teria chegado ao porto antes do julgamento do STF. "A Receita Federal entende que só os pneus que já tivessem sido liberados não seriam atingidos pela decisão do STF, mas a nossa posição é a de que vale a data do embarque", disse o advogado Ricardo Alipio, que pediu novos esclarecimentos ao tribunal na semana passada.
Enquanto a discussão continua na corte, as caixas contendo cerca de 300 mil pneus usados de carros e caminhões continuam empilhadas no porto. A Receita Federal determinou a devolução imediata dos pneus, mas os advogados da Bética conseguiram um mandado de segurança para suspender a resolução.
O inspetor-chefe da alfândega do Rio, Ewerson Chada, afirmou que a Advocacia-Geral da União e a Procuradoria da Fazenda Nacional concordaram com a interpretação da Receita, e que a retenção da mercadoria foi correta. "A legislação estabelece que a importação só se dá no momento da liberação da mercadoria. Portanto, foram liberados os pneus que estavam desembaraçados e só ficaram retidos os materiais que não passaram por essa fase do procedimento", explicou o inspetor-chefe da alfândega do Rio, Ewerson Chada.
A avaliação feita pelos ministros do STF em junho do ano passado foi baseada no artigo 225 da Constituição, que assegura aos brasileiros o "direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado". O veto à importação de pneus usados seria, então, uma garantia de preservação. "Demos um parecer pela devolução do material para evitar um impacto ambiental que não deveria ser nosso. Estávamos virando a lixeira do primeiro mundo", comparou Chada. Segundo a Receita, desde a decisão do tribunal, cargas semelhantes também ficaram retidas nos portos de Santos (SP) e Paranaguá (PR).
Pneus usados vindos da Europa e do Japão são cobiçados pelas empresas de remoldagem devido a seu bom estado de conservação. No Brasil, segundo funcionários da área, a má qualidade das estradas faz com que o material perca as características necessárias para dar origem a um bom pneu reformado. Em média, um pneu remoldado por grandes empresas do ramo custa para o consumidor metade do preço de um produto novo.
Depois da decisão do STF, a Bética suspendeu todos os contratos de importação de pneus usados e interrompeu os trabalhos em sua unidade de remoldagem, em Santo André, na região do ABC paulista, alegando falta de matéria-prima. A empresa aguarda a decisão final da Justiça para avaliar os prejuízos com a carga que não pôde ser liberada e com a retenção dos contêineres que deveriam ser devolvidos às transportadoras internacionais.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Ministro Marco Aurélio, o "voto-vencido"

Marco Aurélio Mendes de Faria Mello é um dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal. Foi nomeado pelo Presidente Fernando Collor de Mello, seu primo, em maio de 1990, para a vaga decorrente da aposentadoria do Ministro Carlos Alberto Madeira tomando posse em 13 de junho de 1990. No meio acadêmico o Ministro Marco Aurélio leva a alcunha de “o voto vencido”, pois suas decisões não costumam seguir o pensamento da maioria conservadora do Supremo Tribunal Federal. No julgamento que dinamitou centenas de empresas e milhares de empregos do setor de reforma de pneus, absolutamente dependente da importação de carcaças em condições técnicas de reforma, o Ministro foi agudo em suas palavras, ao defender que a proibição de importação de carcaças de pneus, ao contrário de proteger o meio ambiente, tinha o indisfarçado objetivo de proteger o cartel dos fabricantes de pneus novos, pois os pneus remoldados, durante muitos anos, atuaram como índice regulador do preço e da qualidade do pneu novo nacional. Depois da sentença de morte aos pneus remoldados, os pneus novos brasileiros voltaram a ser os mais caros do mundo e de durabilidade duvidosa. Veja o voto do Ministro Marco Aurélio. Quando ele diz que a maioria está formada é porque ele foi o último a votar quando todos os demais Ministros já haviam votado pela proibição de importação e o retrocesso da política da logística reversa implantada pelos reformadores brasileiros e a democratização do mercado de pneus.  

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Decisão inconstitucional do STF

No dia 11/03/2009 a Ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, relatora da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF nº 101, proferiu seu voto contra a importação de pneus usados e remoldados ressalvando os pneus remoldados importados do Mercosul. O Brasil perdeu para o Uruguai, por unanimidade, em Tribunal ad hoc do Mercosul. A Ministra ressaltou que as importações do Mercosul sequer eram objeto da Argüição. Disse que a decisão do Tribunal do Mercosul era irrecorrível e que tinha fundamento no art. 4º, Parágrafo único da Constituição. O julgamento foi suspenso por pedido de vista do Ministro Eros Grau. Em 24/06/2009 o julgamento foi retomado. Após o voto do Ministro Eros Grau, que nada disse sobre o Mercosul, o Ministro Ricardo Lewandowski questionou a Ministra se a proibição aos pneus remoldados abrangia o Mercosul. A Ministra respondeu que todas as formas de importação deveriam ser proibidas. Por outras palavras, a decisão do Tribunal do Mercosul que era constitucional em 11/03/2009, se tornou inconstitucional em 24/06/2009. O que sequer era objeto do pedido em 11/03/2009, além de irrecorrível, passou a ser objeto e recorrível em 24/06/2009. Perante o Mercosul, caso esta proibição se concretize, o Brasil descumprirá o Tratado do Cone Sul e sua Suprema Corte o art. 4º, Parágrafo único da Constituição Brasileira. Veja o vídeo abaixo e tire suas próprias conclusões:

E quem julga o Supremo Tribunal Federal?

A novela dos pneus usados que parecia ter acabado no dia 24.06.2009, data que o Supremo Tribunal Federal decretou o fim da importação destes pneus, segue sem definição em relação à Bética. A Bética possui sentença transitada em julgado, mas o STF relativizou seus efeitos declarando que apenas as sentenças transitadas em julgado cujo objeto tenha sido esgotado antes de 24.06.2009 e que não estejam sendo atacadas por ações rescisórias não serão atingidas pela ADPF 101. A sentença da Bética está sendo atacada por ação rescisória, mas seu objeto (deferimento das licenças de importação), foi esgotado antes de 24.06.2009. Eu relatei esta discrepância à Ministra Carmen Lúcia, relatora da ADPF 101, pedindo esclarecimentos da decisão. Ela alegou que eventual discrepância só pode oposta por Embargos de Declaração e por quem não seja amicus curiae. A Bética é amicus curiae. Ela determinou que a petição me fosse devolvida porque o acórdão com o julgamento da ADPF 101 ainda não foi publicado e só depois de publicado é que pode ser objetado por embargos de declaração (o prazo legal para a publicação do acórdão expirou em 24.07.2009). Disse ainda que eventual descumprimento da sentença transitada em julgado deveria ser resolvida nas vias ordinárias, ou seja, pela Justiça Federal do Rio de Janeiro. Eu impetrei mandado de segurança contra o Inspetor de Alfândega do Porto do Rio seguindo a orientação da Ministra. A Advocacia-Geral da União entrou agora com uma reclamação contra a Justiça Federal do Rio de Janeiro alegando descumprimento da ADPF 101. A reclamação está com o Ministro Celso de Mello. O mais grave de todo esse imbróglio é que a decisão do STF foi construída sobre números plantados na imprensa pela ANIP e replantados no STF pelo Ministério do Meio Ambiente, de que o Brasil possui um passivo ambiental de 100 milhões de pneus e por conta desse número seria desnecessário importar pneus usados para os reformadores. Depois da sentença de morte do STF aos reformadores, a associação dos fabricantes de pneus novos - ANIP teve que desconstruir esta mentira para que o Ministério do Meio Ambiente alterasse sua obrigação ambiental, que era de eliminar cinco pneus inservíveis para cada quatro pneus novos fabricados ou importados. O pedido de redução destas metas baseou-se em estudo profundo do Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo (IPT), que concluiu que no Brasil se consome mais pneus usados do que se produz ou se importa de pneus novos. Há várias aplicações para os pneus depois que estes atingem seu limite de vida útil. Pelo menos 60% de que circula anualmente no Brasil tem destino certo em reforço de estofados, como artigos de montaria ou solados de sapato, além dos pneus que não são consumidos no mesmo ano que são adquiridos quando novos e continuam de posse dos consumidores. Por outras palavras, a decisão do STF sacrificou empregos e empresas reformadoras, forçadas a fechar suas portas por falta de pneus usados (sua matéria-prima), baseando-se em números falsos e em catástrofes ambientais que jamais ocorreram. A única catástrofe que o STF evitou foi a perda de mercado dos fabricantes e importadores de pneus novos. Quem julga o que julga o STF?